Voltar para casa é reencontrar um lugar que já não nos reconhece. Ao partir, o sujeito se despede não apenas de um território, mas de uma parte de si. No país estrangeiro, constrói-se uma nova identidade, moldada por outras línguas, costumes e afetos. Contudo, o retorno ao país de origem, muitas vezes idealizado como um reencontro com o lar, pode revelar-se uma experiência de estranhamento e desajuste. Esse fenômeno é conhecido como Síndrome do Regresso.


O que é a Síndrome do Regresso?

A Síndrome do Regresso refere-se ao conjunto de dificuldades emocionais e psicológicas enfrentadas por indivíduos que retornam ao seu país de origem após um período significativo no exterior.
O neuropsiquiatra brasileiro Décio Nakagawa observou esse fenômeno entre os “decasséguis” — brasileiros que trabalharam no Japão e retornaram ao Brasil — identificando sintomas como depressão, ansiedade e sensação de não pertencimento.

Como afirmam Dias (2020):

“O retorno ao país de origem pode evocar sentimentos de inadequação, estranheza e deslocamento, mesmo em ambientes antes familiares.” (Dias, 2020, p. 17)


A Perspectiva Psicanalítica

Do ponto de vista psicanalítico, o retorno pode reativar lutos não elaborados e conflitos identitários.
A identidade construída no exterior entra em choque com as expectativas e realidades do país de origem, gerando um sentimento de deslocamento interno.
O sujeito retorna a um lugar que mudou em sua ausência, enquanto ele próprio também se transformou.

Pussetti (2013) destaca:

“O processo de retorno é marcado pela tensão entre o sujeito que foi transformado pela experiência migratória e o espaço social que o espera imutável.” (Pussetti, 2013, p. 102)

Essa incongruência pode desencadear angústias profundas, exigindo uma elaboração psíquica cuidadosa.


Impactos na Saúde Mental

Estudos indicam que a readaptação ao país de origem pode ser mais desafiadora do que a adaptação inicial ao país estrangeiro.
A pesquisa de Pussetti (2013) mostra que o retorno pode provocar crises identitárias e emocionais, especialmente quando o indivíduo enfrenta dificuldades para reintegrar-se social e profissionalmente.
A sensação de “não pertencimento” pode levar ao isolamento, depressão e outras manifestações de sofrimento psíquico.

Além disso, segundo Rosa et al. (2009):

“O migrante em retorno carrega consigo uma dupla carga: a perda do país estrangeiro e a perda do país natal como espaço de acolhimento.” (Rosa, Berta, Carignato & Alencar, 2009, p. 500)


A Clínica como Espaço de Elaboração

Na clínica psicanalítica, é fundamental oferecer um espaço de escuta que permita ao sujeito elaborar as perdas e transformações vividas.
A escuta sensível pode auxiliar na reconstrução da identidade, integrando as experiências vividas no exterior com a realidade atual.
Como aponta Dias (2020), é essencial considerar as especificidades do imigrante e os efeitos do desamparo discursivo em sua subjetividade.


Caminhos para o Reencontro Consigo


Retornar é um novo partir. É preciso coragem para reencontrar-se em um lugar que já não é o mesmo, e, ainda assim, construir um novo lar dentro de si.


Tatiana Colturato Festi

Psicologa

Referências

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *